quarta-feira, 31 de março de 2010

Cães...

Eu tenho um cachorro que tem 15 anos. Um vira-lata, virgem. Talvez o cachorro mais bonito do mundo, apesar de ter sido apelidado de porco e tudo o mais no mundo.
Eu tinha 13 anos quando ele surgiu numa caixa, no colo de uma tia, e foi dado a mim. Ele miava, não latia, tinha apenas 15 dias de vida. E era a coisa mais pequena que o mundo já inventou. A mamadeira que eu usava para alimentá-lo era quase maior do que ele.
Depois que deixou a caixa que lhe serviu de berço, adotou a minha cama como sua. Destruiu dois colchões quando teve uma infestação de carrapato.
Eu e minha irmã usávamos nossas pernas para ensiná-lo a subir e descer escadas, já que a casa é grande. Quando ele aprendeu, enlouqueceu todos aqueles que trabalhavam na casa. Manchou inúmeras vezes o cimento que os trabalhadores utilizavam para colocar o piso.
Tantas vezes comeu tinta, e tantas vezes foi forçado a beber leite, já que achávamos que o leite iria desintoxicar.
Nunca aceitou beber água no veterinário, apesar de sempre chegar lá morrendo de sede.
Aprendeu a fugir pela grade da porta para a área da casa, até o dia que, não percebendo que tinha crescido, ficou preso e tivemos que ajudá-lo a sair.
Subia na mesa da cozinha pelas cadeiras, mas nunca aprendeu a descer, e latia como um louco até que alguém o tirasse de lá.
Nunca passeou muito, porque tinha a péssima mania de fugir da guia sempre que saíamos com ele.
Adorava andar de carro, até a morte do seu irmão, seja coincidência ou não. Agora é capaz de deixar qualquer um surdo caso seja obrigado a entrar em um.
Na fazenda que meu tio trabalhava, chegou a dormir na minha rede, e até hoje eu me pergunto como não esmaguei o pobre coitado que ficava embaixo de mim de tanto eu me girar.
Quase morre de saudade de mim quando deixei minha casa e não pude levá-lo comigo.
E, quando eu voltei, sete anos depois, estranhou muito minha presença no quarto que fora meu e ele passou a considerar dele.
Hoje, ele tá aqui do meu lado, no mesmo velho quarto em que dormia na minha cama. Com seus 15 anos, pêlos esbranquiçados, um calo nas costas, completamente cego pela catarata não-operável, já com alguma dificuldade para sentir cheiros, mas ainda andando. Ele vem, morrendo de medo de barulho de fogos, e continua se aninhando nos meus pés e pernas, como nas primeiras vezes. Já não dorme mais na minha cama, já não me tem como a primeira dona dele, não pede mais comida para mim, não corre mais enlouquecido escadas abaixo quando alguém toca a campanhia... Mas eu quero acreditar que ele ainda sabe que, haja o que houver, ele sempre vai poder entrar no meu quarto e buscar proteção em mim.

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